domingo, 13 de dezembro de 2009

sábado, 12 de dezembro de 2009

vou falar das coisas vadias. de latas vázias sobre a mesa, sobre a cadeira e sobre o chão. e falando assim das coisas vadias e vázias... vou preenchendo o tempo até que alguém bata na porta, toque o interfone ou me chamem no portão. insinuantemente virar o que há de etílico nesta vida. na embriaguez de sentidos mudos. ficam vázios os copos... copos vádios.

sábado, 28 de novembro de 2009

faz escuro mas eu canto. e canto quando formam os arco-íris.
thiago de mello tinha razão... mas eu adicionaria ao estatudo do homem a conjugação ou o paralelo do estatuto da mulher. pra que caminhem juntos. e mesmo que não faça escuro... eu continuo cantando.

domingo, 22 de novembro de 2009

Estou cansada das canções que não ressoam de retorno aos meus ouvidos. Ou das que não permitem a vibração sentida. Mas tem dias. Assim. Árco-íris por trás dos prédios coloridos, árco-íris no meio das árvores. Corre... parece que ele vem nos pegar! :D

quarta-feira, 4 de novembro de 2009

Quando eles acordam a noite, ainda que esteja sol? Quem me leva os meus fantasmas...
Quando insistindo em levantar as orelhas, apinar bem o órgão que escuta, aquele dentro, perto do interno do corpo, ali. Eles conversam entre si. E como que sorridentes, criam fábulas para explicar meus delírios. Tão sóbreos os meus demônios. Que as vezes até os dúvido - é coisa da cabeça, não vale dar fé!
Outro dia mesmo, achei que haviam partido, tão silenciados que estavam. Dormiam, pois o sol reluzia tão quente que a preguiça das tardes bateu neles também. Mas eu ainda sentia se espregiçarem, se esticando por todo o que sou, por tudo o que é mim. Assim é que os soube ali. Remexiam-se tão lentamente, tão vagarozamente, que tantas vezes me lembravam um feto. A criança gestava em mim. Preservando a saúde - a minha e a deles -, cuidava para não perturbá-los nestes momentos. Mas a tarde já se ia. E na tarde seguinte, o sol a pino retornava e novamente eles se punham a se espreguiçar. Com cautela, tão devagar quanto já não conseguia, me coloquei aos passos va-ga-ro-za-men-te-ca-mi-nhan-te, até o bar mais próximo. Demônios meus, vamos nos refrescar.

domingo, 1 de novembro de 2009

as palavras são destituídas de peso exato. só se tem o peso [e algumas vezes nunca se tem] quando tocam algo dentro daquele que ouve. que peso será dado? será este peso realmente dado? real-mente? da realidade, do real... ou da mente?
...peso, realidade, real, mente. MENTIRA.

sábado, 31 de outubro de 2009

acho que a imagem ficou mais límpida. assim posso organizar melhor aqui dentro... ou talvez deva ser o movimento contrário. primeiro o dentro deva ser entendido. pra então se ter clareza do que está fora. o que está fora?

quarta-feira, 28 de outubro de 2009


Que não se despeça desta forma... e que jamais baste algo assim. São as luzes. São sombras... é tudo o mesmo. Já existiu um dia de alegria. Talvez dois até. Mas não três. Nunca passou disso... dois dias. Se são muitos, ou suficientes, este dois dias, eu não sei. Porque também nunca me preocupei. Não é algo de que costume me ocupar. Algumas reportagens de jornal, algumas imagens nos altdoors... nada muito sério. Por vezes uma espiada pela janela durante a madrugada, mas não passa disto. Se você soubesse. Se pudesse sentir. Te rasgaria todo, inteiro. É mesmo cômico como estas coisas me parecem. Sempre aquilo que mais nos faz sentido... parece tão infantil. Eu sinto também. E não é porque não me escutas que não peço. Às vezes nem eu me ouço. Mas nunca tente usar este sentido pra isto: audição. O que é audível afinal? E quando calo? Assim também não vais me ouvir. Não importa! E se meu grito não fosse mudo, ainda assim, não te deixaria escutar. Você insiste! Eu já pedi que parasse, que me deixasse aqui. Eu estou pedindo. Porque é isto quando se sente assim, esta coisa que não se nomeia. Que se perde ao tentar prender num nome, e já não é o que se tentou nomear.
O cinza dos olhares atravessam a rua. Mesmo que os olhos dela não estejam mirando os dele. Ela admira um vestido pela vitrine de uma loja qualquer. Ele a observa sem saber o que ela olha, porque não vê nada além dela. Era um vestido verde com flores claras - daquela cor entre creme e amarelo clarinho. O vestido era horrível. Ela com certeza pareceria uma dona-de-casa se usasse um vestido daquele. E o que intrigava era o seu ritual matinal de observar aquela vitrine. Todas as manhãs - por volta das onze e meia -, ela surge no final da rua, que termina numa padaria, e desce a ladeira até aquela loja. Permanece alguns cinco minutos do lado de fora... compra um café na barraca de um senhor português que sempre está ao lado, travam uma conversa rápida - também de alguns cinco minutos -, e logo parte, mas não antes de olhar mais duas ou três vezes para a vitrine. As conversas entre a moça que olha o vestido e o senhor português já devem ter ultrapassado as superficialidades. É uma rotinha que se sucede naturalmente. Eu quase posso escutar o que eles falam... em minha imaginação.

Certo dia resolvi segui-la. Não entendo porquê fiz isto. Mas o fato é que o fiz. Ela trabalha na padaria da esquina onde termina a rua, e por isto sempre surge daquela direção. Olha muito pra uma foto que traz no bolso da calça - e do avental enquanto trabalha. São curiosas as fotografias. Por que tanta pretensão em guardar um momento? "Torná-lo eterno"... que piada. Não se preserva nada assim. Somente nostalgias. Se você gosta de nostalgias, então, que guarde suas fotografias empoeiradas numa gaveta. E, de quando em quando, queira derramar algumas lágrimas por elas. É uma escolha também. Deixar um pouco de viver pra se sentir como se, antigamente, houvesse vivido. E sentir toda a melancolia que isto guarda. Mas não vou escrever um tratado sobre fotografias. É verdade que também encarcero as minhas sob a roupa limpa, em gavetas fundas e baixas. Vê? Quanta contradição no humano!
A padaria onde a moça que olha o vestido trabalha serve um capuccino gelado regado à canela. Em algumas manhãs - as que não me encontro demasiado cansado -, costumo subir a rua para conseguir um. Àquele olhar, que a segue e somente enxerga ela, é o meu. Não é que somente veja sua imagem. Também vejo o senhor português e tantas outras coisas e pessoas. Mas todos se relacionam a ela. O que digo é que a percebo. Sua meia-idade. Eu sei o que está lhe intrigando agora... eu a chamo ‘moça’. Sim. É uma moça. Uma moça, pois... não chega a ser senhora. É uma moça-senhora de meia-idade. Ou chame-a como queira, realmente muito pouco me importa. Eu a chamo moça. O rosto dela. Há tanto que o observo. Há tanto que meu próprio rosto se perdeu em minhas lembranças. Nesta idade em que 2, 5 ou 7 anos já não importam tanto. E as expressões já estão todas no rosto. Presentes em cor. Nos riscos profundos que se formam sobre a pele. Mas ela... ela tem um rosto lindo. Iluminado. Se percebe que às vezes fica cansada. E talvez já não tenha a disposição e energia de alguns anos atrás. Mas tão pouco isto lhe tira o brilho, a suavidade. Perde-se tanto com a idade - é através duma xícara de chá que me olho. São olhos cansados estes meus. Vejo qualquer coisa de inocente nos olhos dela. Um olhar perdido, talvez.

Posso contar-te sua estória – a estória que penso ser dela, que criei pra que fosse sua. A estória é esta: a moça vem de uma família complicada, mas afetuosa. Formou-se. E lecionou (ela me parece professora) durante anos em escolas da sua cidade. Casou-se, ou não. Mas... isto deve importar. Creio que se casou. E deve ter tido filhos. A foto que traz junto a si deve ser um filho seu. Uma filha – é a fotografia de uma mulher. Jovem, e muito bonita. E tem os mesmos olhos que os dela. Quando ela olha a vitrine, seus olhos se perdem. No que ela deve pensar? Hoje, seu olhar, lindo e iluminado, deve se perder por seus filhos, por sua estória, seus amores... Penso nos amores que não tive, paixões que não vivi. Bobagem. Não hei de me queixar do que não fiz. Vivi o suficiente, a dose certa do que quis. Do que me permiti. Sempre se vive o bastante.
Esta moça nunca me viu. Claro que já me viu. Mas nunca me percebeu. Tenho inveja de sua juventude de meia-idade. De seu viver pelas ruas, seu não espiar um estranho pela janela. Os reflexos por vidros, vidraças... insistem em sempre dizer o quanto o tempo passou. Intrometidos, diria eu – e quem foi que lhes perguntou?! São onze e meia da manhã. E hoje, agora, não olho pela janela. Observo os livros empoeirados na estante. Livros de quando se acredita em algo, em fazer algo, e crê que se é eterno. Os jovens não acreditam na morte. Nem no tempo.
A verdadeira estória da moça, a estória que eu não sei. Não a que inventei, mas a que eu não sei, mas vou contar. Dela se diz muito pouco... sem casamento, sem filhos. Ela não leciona, faz café. Trabalha numa padaria. Segue sua rotina. Dorme cedo. Mas aos fins de semana ainda se concentra em tentar sair com alguns amigos que também se mantém solteiros. Não, ela não se sente sozinha a caça de companhia. Mas sente a solidão. Nunca quis filhos, nem casamento, nem nada. Talvez seja isto o que mais lhe sinta. Que por nunca querer, nunca tenha buscado. E agora não tenha o que nunca disse querer. Ela é vaidosa ainda. Vejo seus lábios, sempre estão pintados: vermelho. Rosa nos dias em que seus olhos estão mais cansados e se detém por mais tempo observando a vitrine. A moça, moça-senhora, ela traz consigo uma foto sua. Sim. Não teve filha para carregá-la consigo. Ela carrega sua foto. A moça-senhora carrega sua foto de quando ainda era uma moça. Pára de frente a vitrine da loja com o vestido da cor entre creme e amarelinho de dona-de-casa todos os dias. E fica a olhar... Ela observa sua própria expressão. Havia se livrado de todos os espelhos de sua casa. Mas não resistia a ver-se refletida no vidro sempre limpo daquela loja. Ela via suas expressões. Rugas. Velhas expressões cansadas. Lembram-lhe que o tempo ainda passa. E o vestido nem devia ser o mesmo todos os dias. Ela nunca olhou aquela vitrine.

domingo, 25 de outubro de 2009

insinuantemente, assim de leve. resvale, deslize, esfregue. diZpare, absorve as águas. todo o suor, todo o delírio. sobremente de mim mesma. quente.

terça-feira, 20 de outubro de 2009

curta do italiano Donato Sansone... - perfeito!


deixo meu coração
Na mão de quem pode
Fazer da minha alma
Suporte pr’uma vida insinuante

Insinuante
Anti-tudo que não possa ser
Bossa-nova hardcore
Bossa-nova nota dez

Quero dizer
Eu tô pra tudo nesse mundo
Então
Só vou deixar meu coração
A alma do meu corpo
Na mão de quem pode

Na mão de quem pode e absorve
Todo céu
Qualquer inferno

Inspiração
De mutação
Da vagabunda intenção
De se jogar na dança absoluta
Da matança do que é tédio

Conformismo
Aceitação
Do fico aqui
Vou te levando
Nessa dança
Submundo pode tudo do amor (pode tudo do amor)

Porque não quero teu ciúme que é o cúmulo
Ciúme é acúmulo de dúvida, incerteza
De si mesmo
Projetado
Assim jogado
Como lama anti-erótica
Na cara do desejo mais
Intenso de ficar com a pessoa
E eu não tô à toa
Eu sou muito boa

Eu sou muito boa pra vida
Eu sou a vida oferecida como dança
E não quero te dar gelo
Jealous guy

Vê se aprende
Se desprende
Vem pra mim que sou esfinge do amor
Te sussurrando
Decifra-me (decifra-me)

Só deixo minha alma
Só deixo o coração
Só deixo minha alma
Na mão de quem pode

Só deixo minha alma
Só deixo meu coração
Na mão de quem ama solto

Eu vou dizendo
Que só deixo minha alma
Só deixo meu coracão
Na mão de quem pode
Fazer dele erótico suporte
Pra tudo que é ótimo fator vital

domingo, 18 de outubro de 2009

falo às vezes com versos de poeira, porque tenho em mim algo que escapa. como o desenrolar de dias frios. tenho em mim a dor dos passantes, mas respeitosamente inquieto, respeitosamente silente. se há o verbo silentiar! que se faça.
tão longe quanto possa me colocar de mim mesmo, a perversidade dos escuros busca por um grito. e eu não calo. não tenho o direito de me render ao vão das horas. das vespas que entram pelo quarto. no silenciar de me fazer no grito. dois passos são dois goles de veneno. pequenos goles de venenos quentes. qual deles será o mais mortífero?

domingo, 4 de outubro de 2009

Dos afetos que eu tive, poucos me sobraram. Alguns nem mesmo percebi. Não tanto, ora, tão simplismente, por descuido ou desatenção. Mas por não serem cumulativos. Por me atravessarem muito mais do que permanecerem, e fazerem de mim, de ti, algo que vivi. Por transformar apenas. Por transformar e nada além, nada mais. E do irreversível que se torna... se forma, me fiz. Para aquém das possibilidades, para além das conjugações...

domingo, 27 de setembro de 2009

entre os ditos e não ditos. diz-ditos. des-ditos. dez-ditos. e segue dizendo...

domingo, 13 de setembro de 2009

POEMA

Se morro
universo se apaga como se apagam
as coisas deste quarto
                                 se apago a lâmpada:
os sapatos - da - ásia, as camisas
e guerras na cadeira, o paletó -
dos - andes,
          bilhões de quatrilhões de seres
e de sóis
        morrem comigo.

Ou não:
       o sol voltará a marcar
       este mesmo ponto do assoalho
       onde esteve meu pé;
                                     deste quarto
       ouvirás o barulho dos ônibus na rua;
           uma nova cidade
           surgirá de dentro desta
           como a árvore da árvore.

Só que ninguém poderá ler no esgarçar destas nuvens
a mesma história que eu leio, comovido.

Hola mi amigo,

Entonces, por estas horas, estive pensando de[s] gostos. E das descobertas que se irrompem, das palavras que saboreiam. E lembra-me tanto descobertas, dos descobridos que eu fazia. Uma poesia perdida em algum lugar, num possível que não veio a ser... puro devir. Este dia, très belle, alguém toca sax no meu telhado, enquando leio poesia. Logo depois que se foi... você. Ficou um gosto de gosto, de saborear. De dias assim: quero me perder neste dia, pra que ele não se perca de mim. Me acabar nele pra que ele não acabe. Firulas e tonterias... borboletear! E das literaturas e poesias... clube do livro! Resolvi dividir. Quis te mandar uma carta, mas não tenho seu endereço. Tenho ainda este gosto por toques [e uma caixinha de cartas sobre meu guarda-roupa]. Quis dividir, quis também trocar. Que quer você? Faz saudades onde moro!
A dúvida foi escolher qual enviar...


A morte não existe (John McCreery)

Não existe a morte. Os astros se vão
Para surgirem em outras terras e
Sempre brilhando no diadema celeste,
Espalham seu fulgor incessantemente.

Não existe a morte. O chão que pisamos
Converter-se-á pelas chuvas estivais,
Em grãos dourados; em doces frutos;
Em flores que luzem suas policromias.

Não existe a morte. Embora lamentemos
Quando o corpo denso de seres queridos
Que aprendemos a amar, sejam levados
De nossos amorosos braços, agora vazios.

Eles não morreram. Apenas partiram,
Rompendo a névoa que nos cega aqui;
Para nova vida, mais ampla, mais livre,
De esferas serenas, de brilhante Luz.

Embora invisíveis aos nossos olhos;
Continuam nos amando. Estão connosco.
Nunca esquecem os seres queridos,
Que pelo mundo, atrás deixaram.

Não existe a morte. As folhas do bosque
Convertem em vida o ar invisível;
As rochas se desintegram para alimentar
O faminto musgo que nelas se agarrou.

Não existe a morte. As folhas caem;
As flores murcham e desaparecem;
Esperam apenas durante as horas hibernais
O retorno do suave alento da Primavera.

Embora com o coração despedaçado,
Coberto com as negras vestes de luto,
Levemos seus restos à obscura morada
E digamos que eles morreram.

Apenas despiram suas vestes de barro,
Para revestirem com trajes cintilantes.
Não foram para longe, não nos deixaram;
Não se perderam; nem mesmo partiram.

Por vezes sentimos na fronte febril,
Suave carícia ou balsâmico alento;
É que nosso espírito ainda os vê,
E nosso coração se conforta e tranquiliza.

Sempre juntos a nós, embora invisíveis,
Continuam esses queridos espíritos imortais;
Pois, em todo o infinito Universo de Deus,
Só existe Vida - NÃO EXISTE MORTE.

___________

[Penso que se vale na ausência. Na presença de uma ausência. Vale na saudade!]

1 bj, com o borboletear amarelo voando aos versos...


sexta-feira, 11 de setembro de 2009


parada em frente ao muro vermelho eu penso em quanto tempo isso tudo pode virar pó. em quanto tempo? a tinta já gasta ou ainda fresca. são detalhes meros e lúdicos de um discurso qualquer. discurso a quem... sabe lá! das companhias os céus de nuvens passam rapidamente como que dando lugar a um temporal que se anuncia. o muro vermelho. de um vermelho já não tão vivo. escurecido pelo cinza do céu. suporta a alegria vibrante em dias de luz. os pés descalços. acostumados. tão submetidos a tudo aquilo havia tanto tempo. que já a submissão não era submetida. mas adquirida de modo legítimo. quase científico. errare humanun est. e das companhias. dos acompanhantes. preferi os pontos. que servem tanto para bastar. quanto para retomar o caminho. endireitar o olhar. e caminhar um novo espaço.

domingo, 6 de setembro de 2009

Tem bêbado que fica rico, tem aqueles que ficam poliglota!

terça-feira, 1 de setembro de 2009

as vezes as luzes ficam melhor apagadas. Ficam, também não ficando, indo-se bem... às vezes.

sexta-feira, 28 de agosto de 2009

que seriam os livros. pensei por um instante em algo como borboletas. e tive em mente uma estória de infância. pequena estória de infância. e vou contar. é uma brincadeira. muito mais do que uma estória. alguém deve conhecer. pode não ser novidade... é linda. se abre o livro mais ou menos no meio. do meio. isto é. no meio do meio. pega uma folha de cada lado e coloca toda a sua borda rente a outra. formando um arco sobre si. sobre a própria folha. e faz-se isto. uma atrás da outra. formando vários arcos. que formam uma forma. rs. em meia flor. tão bonito. criança. meu pai quem me ensinou!

quinta-feira, 27 de agosto de 2009

Firulas! C'est tonteria[s].
por la calle...
Como cadeiras de madeira, com os pés quebrados, tem aqueles que precisam de manual para saber andar... estão quebrados. O piso frio, chão batido, com a porta e janelas entreabertas mesmo num dia frio. Imóveis, todos permanecem em sua própria absorção, cada um em seu próprio devir. O que haverá de vir dos dias frios com mentes devaneantes que não se falam entre si?
- Você pensa que eu não estou te vendo, só porque não te encaro, digo, nos olhos? [pensei alto, o que fez com que ele se virasse, com cara de assutado]
- É comigo? Deve ser comigo... é?
- Pensava dos dias frios, e das janelas abertas. Por que as deixamos abertas nestes dias?
- Feche-a se quiser. Não me incomodo.
- Com o quê?
- Com o quê, o quÊ?
- Com o que você não se incomoda?
- Você está começando a me incomodar.
- Desculpe. [pensei cheia de culpa - talvez ele estivesse no meio de algo importante e eu o interrompi. EU, com as minhas tonterias]

[Um diálogo de uma só voz na minha cabeça!]

Mas tinham mesmo, como se chamavam... aquelas cadeiras. Tortas e de madeira, aquelas cadeiras. As pernas quebradas não pareciam pedir conserto. Não pareciam pedir nada. Penso que foi coisa da minha cabeça, não sei. Acho que foi.

terça-feira, 25 de agosto de 2009

segunda-feira, 24 de agosto de 2009

respeite a dor que os passantes levam consigo...

terça-feira, 18 de agosto de 2009

segunda-feira, 17 de agosto de 2009

Lembro das janelas e um círculo de luz. Atrás, um barulhinho. Se não houvesse me virado com rapidez, tinha toda se esvaido... e eu nem tinha pego aquele tantinho de sorriso no ar, antes de se ir toda.

Um sorriso pra ti! [mas vire-se com rapidez! E ele fica de segredo entre nós!]

sábado, 15 de agosto de 2009

Talvez........... eu pense algo para ser dito mais tarde. Agora nada me ocorre. Só este vázio.
Como um poema de Cecília, o choro me vem perto dos olhos... para que a dor transborde e caia... o choro vem quase chorando. Os olhos me dizem. Não sei o que me dizem ao certo, mas é certo que dizem. Me fitam vivamente, de um gesto tão melancólico que não nega sua vida. Concentrados... estes olhos. Eu vejo as frases que escreveu pelas paredes do seu quarto. Elas me decifram você. É seu jeito de me dizer quem é. Assim você não precisa dizer. Sem se expor. Eu talvez te compreenda melhor agora. Talvez isto realmente me ajude a entender. O vidro da sua janela é quase indecifrável. É a sua letra, tantas pessoas já te disseram isto. Não sei por que, afinal, não cede. Os poemas de Cecília e de Quintana dizem tanto de quem és, quase me perco neles.
Se você visse a imagem pra que olho agora, mas você está de costas pra ela. É a imagem de uma peça que certa vez eu vi. "Adubo, ou a sutil arte de escoar pelo ralo", era este seu título. Destas que fazem a tragédia humana parecer interessante. Sabem tornar o ridículo da existência do homem em algo que, embora tragicômico, não caia na vulgaridade ou num clichê barato. Uma peça muito boa, não recordo o nome da companhia. Também não vou me virar para ver. Não quero perder este fio que nos une agora pelo olhar.
Não gosto da cor das paredes de seu quarto. Faz algum tempo que penso nisto. Estava pensando nisto agora, até que Adriana Calcanhoto resolveu que alguém tem medo do amor. Ora, é claro que se tem medo do amor. E por que não se haveria de ter? Coisa ridícula esta estória de amor! Quem precisa disto? É lógico que todos tem medo do que se furte ao controle, e anula a consciência enquanto sede da razão. Já ouviu falar em algum ser humano racional apaixonado? É óbvio. Não, não é simples assim. Que simplista. Não que seja mentira, mas muito pequeno. A verdade mesmo é que tudo no fim é muito sofrimento. Quantas lágrimas, sempre lágrimas. Não adianta. Pode tentar argumentar, mas nunca vai me convencer porque as coisas são assim: tudo acaba. Nada é verdade e tudo acaba. Quanta baboseira! Diversas frases enjoativas e babosas. A verdade é que acho tudo isto muito chato. Uma discussão desnecessária. Tudo muito entediante. Antes as paredes verdes de seu quarto das quais não gosto.
Estou cansada. Isto é só um fragmento, um devaneio. Não sei por mais quanto tempo conseguirei levar isto adiante. Seus olhos são lindos... vou me virar agora. Este espelho que nos une precisa ser limpo. Tem tantas manchas de minhas mãos... de quando tentava te alcançar. Hoje entendi. Entendi que não é assim que chego a você. Boa noite, sonhe.

terça-feira, 11 de agosto de 2009

.....................e como é que a srta quer deixar a face do planeta??uahuhau...
sugiro cores! muitas cores. cores vibrantes [estas me lembram uma leonina!! toda colorida, hehe]
e tb tons suaves - que às vezes são necessários entre uma vibração e outra,
aquele toque mesmo de se deixar um suspiro, um tempo pra pensar.
Há de ter vermelho! A-PAI-XO-NA-DA-MEN-TE... arrebatador!
Certamente há de ter verde, pra garantir o ar, a respiração pura [se possível for!]
Então eu digo, para mudar a face do mundo... eu digo: SIM!

terça-feira, 4 de agosto de 2009

Às vezes é a própria poética do descalço que me faz pensar. Não da poetização pura de andar no asfalto. É a expressão como em Lavoura, dos pés dizendo, suavemente soprando suas imagens tão claras, enquanto a voz do locutor-narrador-personagem-principal conduz à cena o lirismo que mesmo não lhe falta, ela é em si, toda. Termina por aparar-lhe as arestas e jogar alguma intensidade leve. De modo algum que isto seja paradoxal. De Arcaica que é, encanta. Os pés se dizendo, ressoando o interno ao som da poética desnuda que a voz suave sopra à cena. Lírico!

segunda-feira, 20 de julho de 2009

domingo, 19 de julho de 2009

sábado, 18 de julho de 2009

Angústia é coisa assim. Coisa sem explicação, coisa que deixa a gente sem saber de onde veio, porquê veio. É coisa sem nome. Aliás, a única coisa que lhe deram foi um nome, destes que fica revirando no estômago em círculo sem dar em nada, nem chegar a nenhum lugar. Mas há um tempo passa, ou porque foi decifrada, ou porque se esqueceu de decifrar, e ela cansou de girar.



[e então a gente senta, troca aquelas palavras mudas entre os olhos, e diz... das palavras mesmo, dos nomes das coisas, das coisas vázias que só tem de si o nome]
Dos verbos intransitivos, o ecoar de catherina é que me falta. Das faltas as maiores, das dores as mais fortes, das saudades as profundas. Pois tudo o que me move é assim... intenso. Pois que as solidãos [ou seriam solidões?], elas mesmas, de muitas que são, são também sozinhas.
E estes dias, um dia destes, a própria solidão me olha intransigente, como quem afronta, perguntando as horas em que as coisas passam, e do tempo que não vem.
Sabe o que lhe respondi? Encostada na parede, uma das mãos apoiada no mármore da pia e os olhos fundos no espelho: Espera! Que eu espero de Catherina, uns fragmentos tais. Um pouco do amor. [E ele vem! sempre vem!]...

[de noite, tarde-já-madrugada e diz assim: Amo!]
No repentino de se criar o azul no improvável dos dias iguais... faz melhor olhar a névoa que paira lá fora. Entre o fora e o dentro daqui, o reflexo no vidro da janela desempenha a monótona passagem dos atos, lentos. Algo bom de som... en français! Elle est plus forte que toi...

quinta-feira, 16 de julho de 2009

Numa valsa louca, presa entre a epopéia delirante que se desloca entre um cabelo colorido e a porta desta sala. Vagamente o ar se extingue enquanto uma tontura toma conta da minha cabeça – no lugar dos pensamentos que me traziam você... fecho os olhos. Nietzsche disse: há no mundo um único caminho que ninguém, exceto tu, pode trilhar. Mas que caminho? O caminho não existe. O que existe é o não-caminho. É nada.
Ele andava por entre carros num estacionamento de luzes acesas. Sabia bem porquê estava ali. E por isto ainda um pouco mais permaneceria. No passado, não muito distante, ele havia se sentido vivo. Havia sofrido. E por isto sentiu-se vivo, pois a dor nos traz a certeza precisa de que se vive e a dimensão de seu corpo, não de seu corpo físico, mas de seu corpo que sofre, aonde dói. Mas isto nunca admitira pra ninguém. Teria sequer contado pra alguém? Mantinha esta dor guardada consigo como quem guarda diamantes, sem dizê-los. Tinha aprendido a deixá-la ali, enquanto saia com os amigos, falava com seu chefe, cumpria com sua rotina... esta dor permanecia dentro de si; agora em silêncio. Aprendeu a acompanhá-lo com certa reverência e um silêncio respeitável. Andou ainda algumas horas entre os carros, cerca de duas ou três, até que o vigia noturno o interrompeu em seu silêncio – apagara as luzes que lhe iluminavam o olhar baixo e seu lento andar que pisava pelas poças de óleo e gasolina e lhe molhavam os sapatos. Quis sentar-se, não havia onde. Decidiu voltar a seu apartamento num bairro periférico. No caminho passa por prostitutas e bêbados, ruas com garrafas quebradas, latas jogadas pelas calçadas, bueiros abertos e neste caos, neste cenário sujo, uma peça de teatro, uma cena onde ele... ator tão coadjuvante quanto aquelas prostitutas, aqueles bêbados, e mesmo aquelas latas vazias pelas calçadas. Ele se sentia tão bem, envolvido. Seu habitat natural ('natural?'). Sentiu que fazia parte daquilo. Tão perfeitamente e mais do que se sentira a qualquer dia de sua rotina que não só se repetia, como se sobrepunha e se anulava, o que acabava por a renovar, torná-la não tão monótona.
Mudou-se para este bairro a pouco mais de uma semana. Mas seu apartamento não tinha aquele cheiro do que é novo, aquele cheiro de algo que ainda não é seu. Tinha outro cheiro. Cheiro de mato. Aquele cheiro que se sente quando a gente arranca uma folha duma árvore qualquer e a cheira (ou seria outro o cheiro?). A sala era também o quarto. Ao lado direito uma pequena porta dava acesso ao banheiro. À esquerda ficava um cômodo ainda menor que a sala-quarto, e pouco maior que o banheiro, a cozinha. A única janela via-se logo ao se abrir a porta e dava para um clube de jogos de cartas clandestino. Ele entrou lá uma única vez. O cheiro de urina, cigarros e álcool fê-lo querer sair em poucos minutos. Possuía um estômago sensível. Era um homem sensível, de gostos sutis. Gostava da sensação daquela brisa entre o entardecer e o anoitecer passando pelo rosto; gostava de uvas – das roxas pequenas, não das itália ou rubi que achava-as grandes e exageradas e impossíveis de serem colocadas duma só vez dentro da boca. Estes todos eram quase segredos seus. É daquelas coisas que ninguém diz e poucos percebem. Não as falava. Tinha aquela discrição de quem acredita que estas coisas não interessam a ninguém – e a quem interessam realmente? Achou melhor deitar-se, mesmo sabendo que não dormiria. Antes ainda folheou alguns livros que havia comprado em alguns sebos, os quais ainda não lera... nem sabia quando teria tempo para isto. O trabalho e uma vida social exigem tempo. Tudo bem, o trabalho exige muito tempo. Deitou-se enfim. E aquela foto. Ela ainda estava ali. Tentara livrar-se dela, guardá-la no fundo de alguma caixa com velhas fotografias, papéis antigos e coisas que não se sabe porque se guarda, mas ela sempre voltava. Horas após tê-la escondido, ela voltava. Era necessário que voltasse. Ele tinha medo de que acabasse por não voltar um dia. E de alguma forma estranha, estes retornos o tranqüilizavam de sua volta. Ele temia e sabia que não precisava temer... sabia? Ele temia sempre. Quando esta volta demorava mais do que o habitual ele mesmo cuidava para que ela acontecesse – por este medo de não acontecer.
Não dormira. Eram três e cinqüenta da madrugada de uma quinta-feira e ele ainda não dormira. Teria de levantar-se para trabalhar em 2 horas. O jeito era tomar um café forte pela manhã. Decidiu ir ao clube de jogos de cartas, lugar de que nem gostava. Estas coisas que se decide fazer quando a angústia nos engole e não conseguimos afastá-la nem pensar noutra coisa melhor pra fazer. Abriu a janela e viu do outro lado da rua o portão que escondia o clube clandestino. Caminhou até seu guarda-roupa para pegar algo para vestir-se. Mudou de idéia. Não queria vestir-se, nem mesmo queria ir até o clube. Desceu as escadas de seu prédio que o conduziam à rua. Antes mesmo que atravessasse a rua ouviu B.B. King tocando meio abafado. O segurança do local o conhecia, isto o liberou de precisar – alguém precisava? – duma senha para entrar no clube. Sentiu de imediato aquele cheiro composto de urina, cigarros e álcool, mas não tinha mesmo nada melhor que fazer ou para onde ir. Disto, não resolveu ficar, só não tinha uma outra opção. Pensava na fotografia. Sempre pensava na fotografia, estava sempre pensando nela. As vezes se distraia nas conversas com algum amigo, ou com algum problema profissional. Mas era só. No restante do tempo pensava sempre na mesma coisa. Nela, a fotografia.
Sentia que a qualquer hora a cortina deveria se levantar e os aplausos pela bela peça que encenara lhe seriam dados. A peça amargurada que encenara. Triste. Uma peça cheia de angústia, mas não era amargurada. Talvez um pouco azeda. Mas só um pouco. Azeda como a careta que se faz quando se chupa um limão. Não azeda como os velhos que furam as bolas que caem em seu quintal. O conhaque que pedira chegou. O rapaz, de aparentemente seus vinte e poucos anos, que lhe serviu olhou-o fundo nos olhos enquanto colocava seu copo de dose sobre o guardanapo de papel que estendeu em cima do balcão para isto. B.B. King que cantava Days of Old quando ele entrou no bar, agora canta Three O´Clock Blues. Àquela... fotografia. Era dedicada a ela que cantava. O que King teria pensado dela? Qual seria a expressão de seu rosto ao vê-la? Talvez seu blues se tornasse mais amargo... amargo não, triste, angustiante. Isto. Era angustiante. Sempre achou que o blues tinha uma dose de angústia que lhe enobrecia a dor. Era esta imagem, a fotografia, a portadora de toda sua linda tristeza. A esta hora ele não combinava com aquele cenário, não combinava com o clube clandestino de cartas, nem com B.B. King tocando blues. Realmente, em nada combinava com blues. Talvez sua barba por fazer e aquele aspecto distinto de quem vai se aproximando dos quarenta anos de idade. Aquela maturidade que parece inerente a quem quer que tenha mais de vinte e cinco anos... não, mais de trinta e cinco pelo menos. Mas era só. De resto, em nada se enquadrava naquele lugar.
Uma gestalt (ou objeto de uma) – não entendo de psicologismos – era isto o que a fotografia era pra ele. Como quando culpamos uma única coisa por tudo o que nos acontece ao redor. Era assim que a fotografia aparecia pra ele. Ela era seu foco. Sua única responsável. Sua culpada pela sua dor. Dor que ele já amava. E amava porque mesmo doendo, era dor dela, a dor vinda dela. Doía pra ela... então sentia pra ela. Quando é que esta noite iria acabar? Não se assustem. Esta pergunta é feita todas as noites. Faz parte desta estória. Faz parte desta agonia, ela precisa disto. Já nem saberia viver sem ela. Mas esta noite precisava e iria acabar, como as outras (?). O dia sempre amanhece, não? Lembra-se dum dia quando criança, não sabia porque esta imagem vinha-lhe a mente neste momento. Mas lembra-se de estar andando de bicicleta, e de um amigo lhe dizendo pra não olhar... que não olhasse. Lembra-se ainda vagamente de ter olhado. Mas olhado o quê? Quantas perguntas! Isto ele já não lembrava. Tinha mantido este costume de não seguir os conselhos dos outros. Talvez fosse por isto que sofresse tanto, sempre era necessária a decepção para que entendesse. Quando era ainda um adolescente uma guerra civil estourou em seu país. Num determinado episódio – deste jamais esqueceria – sua mãe lhe pedia (lhe ordenava) que não olhasse, que não virasse seus olhos. Viu um fuzilamento a queima-roupa, tão próximo que ainda hoje é com dificuldade que acredita que realmente o presenciou. Tomou seu conhaque num só gole.
Um dia, percebeu que havia passado toda a vida assim, como nesta noite. Ia a lugares aos quais não queria ir, por motivos que desconhecia. Tudo simplesmente acontecia. E ele nada tinha haver com isso. Seus sentidos já não lhe diziam. Mas a dor... a agonia. É o que ainda está. Sempre estará! Sempre isto. O dia amanhece, começa a clarear – o dia sempre amanhece! – Ele vai passar mais um dia pensando nela. As fotos nos jornais, ele não as vê, porque em todas enxerga ela. Quando anoitecer voltará ao estacionamento. E andará entre os carros molhando os sapatos em gasolina até que as luzes se apaguem. Ou irá a outro lugar qualquer também sem importância. Ele não vê o lugar, não vê as pessoas, só aquela imagem na fotografia lhe vêm aos olhos. E igualmente, tão insignificante, cairá a noite. Atravessará a rua até o clube de cartas depois de olhar pela janela no meio da madrugada. Ou também a qualquer outro lugar tão indiferente. É o seu não-caminho, seu eterno retorno renovado.
Suas mãos transpiram quando pensa nela. Ele gosta de olhar suas próprias mãos. E ele gosta da luz. Pois a luz lhe lembra ela. E aqueles vaga-lumes e siriris da sua infância. Lembrava de quando brincava na rua e o farol de algum carro que interrompia a caçada aos siriris iluminava a nuvem destes bichinhos que voavam pelo meio da rua. A noite é tão mais romântica... e tão solitária. Talvez por isto vague a noite. Sozinho. A noite, no escuro, é sua metáfora. É seu contradizer a ela. É como lhe diz que não a quer... mas é um dizer que deseja. O querer de alguém que não sabe o que quer, porque nunca sentiu sua presença. Nunca possuiu em seu corpo esta marca. Ele não pensava em saídas. Conformava-se em sentir sua falta. Estava conformado com a certeza de que sempre seria assim. Tinha aquela certeza inebriante. Aquela de uma embriaguez que nos faz duvidar, se é real. Afundava-se na sua inexpressão. Evitava olhar-se ao espelho. Pois isto lhe trazia a ausência dela. E aquela fotografia... era um recorte. Um recorte de revista. Um sorriso. Algo que ele nunca teve, mas quanto medo tinha de perdê-lo...
Posto que é sempre indizível. Incalculável. Posto, que a noção das horas todas falham. Os sentidos se perdem... não nomeiam... não se acham.

sábado, 11 de julho de 2009

LÍRICO:

1) do poético;
2) lavoura arcaica;
3) EU-lírico (alterego poético)
da lata que bate nos trilhos e faz o barulho da lata, que bate nos trilhos, correndo, batendo nos trilhos, e fazendo o barulho que bate nos trilhos, da lata, da lata que bate. Bate nos trilhos, fazendo o barulho dos trilhos que bate na lata, que bate na lata e bate no barulho que faz dos trilhos o barulho que bate...
a roupa da pele da roupa da pele da roupa da pele da roupa...

quarta-feira, 8 de julho de 2009

e guarda-chuva pra quÊ? guardar o quê? Logo a chuva? Não, não e não. Definitivamente. Se guardar do céu, de olhar pra cima, de ver as nuvens. Um tanto romântica esta descrição. E o céu, onde é que fica? O céu é a atmosfera terrestre? O céu da Terra? Assim teríamos também o céu de Vênus, de Marte, etc-etc. Ou céu é tudo aquilo onde o ar adentra, se esvai. Onde o homem já não pode alcançar, não pode pegar com as mãos? O céu se confunde com o espaço? E então, tudo seria céu, um só, imensamente infinito. Ou - retomando os diversos céus que se limitam no entorno do astros - o céu seria uma abstração imagética, limitada a nossa visão? Acaba o céu como findam as camadas gasosas? Onde fica o céu?
Céu meu. Céu teu. De onde surges que não do abismo dos meus pensamentos devaneantes num dia pré-atividade-acadêmica-avaliativa?

domingo, 28 de junho de 2009

Que há de ser uma pandemia? Para ser mais sincero com as emoções, com a forma com que penso - e podo as arestas para publicar - que RAIO é uma pandemia, afinal?? Parece algo de mistura entre pânico com epidemia, algo que fica assim, à meio caminho, perdido. Seja lá que critério se use para decifrar este enigma, o caso é que sempre se percebe: tem um pouco dos dois, digo, de pânico e de epidemia. O pânico vem mesmo é da idéia de se ter uma epidemia. E as pessoas esvaziam os prédios, viajam, compram máscaras e se abrigam em suas casa com portas e janelas fechadas. Param de fazer visitas, de ir ao supermercado, param de chorar. Estranho, pode até parecer. Mas é óbvio também, até de uma obviedade irritante. Sim, porque antes do pânico, àquele que vem dosado com desespero, a gente sempre conserva as lágrimas à reserva, como que prevendo precisá-las mais adiante. E o que faríamos se não houvesse esta prévia de distinção, apreensão, mas sem desespero? O caos viria sobreposto a esta falta de lágrimas, falta de ter com que escoar o temor... isto sim, me parece, seria uma pandemia.

sexta-feira, 26 de junho de 2009


Avisos, preocupações e especulações diversas e infundadas, tantas vezes. As palavras vão com o ar, se espalham, como o vírus. [A-H1N1]. Esvaziem as UniBOLHA, esvaziem a UniBOLHA. Vão todos embora... esvaziem a UniBOLHA!!
Pergunto, eu, com os meus botões, ou com os botões alheios:
- E eu, que moro aqui, pra onde vou?
As aulas foram canceladas até segunda ordem. Todos os docentes, servidores e estudantes estão dispensados... Exceto! [sempre tem um 'mas', um 'porém', 'entretanto'... ou um 'exceto']. Exceto os servidores da segurança interna. Os prédios precisam ser protegidos. Os porteiros da Casa do Estudante da UniBOLHA não foram dispensados, nem os vigilantes.

moral da estória:

ELES SÃO MAIS RESISTENTE AO VÍRUS!

sexta-feira, 19 de junho de 2009

Algo de Tom... Jobim. Caetano, Chico, Elis, o quê mais dizer? Algo de bossa, de samba, de misturas e gostos que já não se disse? Seja do Iapoque ao Chuí ou de Pelotas a Rondônia... o jeitinho brasileiro. Jeitinho malandro. Malandro como, tiu? Malandro que nem Zeca, ou malandro como o Zé? Malandro de bamba, que samba e se diverte num som de roda ou malandro ladrão de galinha, que rouba no supermercado da Dona Odélia pra ter o feijão pra por na mesa das crianças? Ou ainda, malandro de malandrear sem ninguém, sem tostão, sem motivo... Das malandragens, deixo aqui a minha também... brasilidade... este discurso sem pretexto, sem pretenso, sem fim.
Firmo aqui e deixo claro o meu descontentamento comigo mesma. Sim, comigo. Comigo enquanto eu, claro, porque enquanto este 'eu' que escreve agora, e que não é efetivamente o 'eu' - propriamente dito; me chame de alter-ego. Ops, caiu o hífen, alterego, que seja.
Toda a razão de meu ser descontente é esta linguagem acadêmica enfiada guela abaixo por 4 anos consecutivos. Todo o formalismo desenfreado. Então instituo o contracontrole neste blog, neste que é meu grito: Não mais justifico o texto. É isto mesmo, vai ficar assim, todo desencontrado no final - que até facilita pra não se perder na troca de uma pra outra linha.
E isto feito, declarado e postado. É fim.

sexta-feira, 5 de junho de 2009

comentários implícitos sobre alguns-ditos movimentos...


Matéria sobre o psicanalista Slavoj Zizek e a renovação do marxismo

http://revistacult.uol.com.br/novo/dossie.asp?edtCode={8FE51465-5268-40F5-8990-0D4D00C2B0A4}&nwsCode={FD286606-873E-4C18-BA04-3BCB70C8C781}

Com baixíssimo orçamento e linguagem afiada. Um movimento que se assemelha ao Nouvelle Vague, surgido no final da década de 1950 na França, dá indícios de articulações no Brasil. Da frase do cineasta Jean-Luc Godard, que afirmou filmar para escrever e escrever para filmar, vê-se um resgate no cenário carioca. Partindo primeiramente como críticos e alcançando a tela, uma geração nova de cineastas busca resgatar a imagem que faz refletir; separação entre cinema e publicidade.

 

Segue link para matéria completa.

http://bravonline.abril.uol.com.br/conteudo/cinema/nouvelle-vague-brasileira-473615.

É que falar da memória, e dos passos, exige sempre um minuto de lucidez. E nunca vou saber onde devo parar, pois não é assinalado em placas de néon. Eu havia feito o pedido para que trocassem a fechadura enferrujada, antiga, gasta. Embora gostasse daquele ouro envelhecido. Olhar para ela sempre me dava vontade de tomar chá. EU não sei. Quero dizer, quem é que vai saber qual relação há entre uma coisa e outra?

- Isto foi uma pergunta?

- Não... exatamente.

- Exata-mente.

- Xícaras de chá, às vezes, tem o contorno da borda, o detalhe, pintado de ouro, sabe... envelhecido. Talvez se explique por isto.

- E estas xícaras, de onde são?

- De minha mãe. Na época em que ainda morávamos em Granada.

- Fale mais sobre isto. (xeque!)

- Ridículo.

- O QUÊ?

terça-feira, 2 de junho de 2009

Agora que aprendi...rs, a postar vídeos... vai o curta metragem apresentado no Anima Mundi, em Sampa, julho de 2008. ótEmo!!

sábado, 30 de maio de 2009

Vou caminhar. Depois de noites sumidas, dias corridos; vou buscar o que esperar e poder parar e caminhar, simplesmente. Através do tráfego, não de carros, mas de gente, humanos, tantos rostos e infortuitas expressões, cansadas e esquecidas. Tendo sorte, e tendo tempo, posso tomar um banho. Suado do dia corrido e cheio, buscar no travesseiro um pouco de esquecimento, e deixar as memórias nos sonhos, para aquele que sonha, que não sou eu. Eu durmo. Posso talvez, buscando alguma calma, abrir um vinho, encher uma taça ou, tão indistintamente, virar o conhaque. Um gole pode ser tudo. Vou tentar fingir, quando passar frente ao espelho, que pouco me importo, que tanto me faz o tempo. Eu digo, repito e afirmo, as linhas de expressão são marcas lindas, são cheias de significação... eu minto, eu repito. Isso eu nego, eu acredito. O certo é que no fim do dia vou dar um rolê... fazer um rango... gritar bem algo... algo assim, cotidiano.

sexta-feira, 15 de maio de 2009

Não sei o que acontece com a gente, mas a gente tem um jeito novo de se aventurar. [p/ espelho] "Hei, EU TÔ FALANDO É COM VOCÊ......"

segunda-feira, 11 de maio de 2009

Caminhando lenta e cui-da-do-sa-men-te sobre o beiral que dava para o desfiladeiro, àquela vertigem de alturas incónumes ou de dias ruins não estava em meu estômago. A pedra era gelada nos meus pés descalços que, tão cuidadosamente, escolhiam o exato milímetro onde colocar sua ponta e deixar-se acomodar o restante da palma com frio. Essa dança perdida assemelhava-se a um flutuar alucinante, tão desprezo do ser que quase se tornava automático. E o controle sobre os passos parecia esvair-se a cada novo andar, cada novo pulso de tempo. E a velocidade como que crescia, como que ficava intacta - era algo da ordem das sensações insertas, do incognoscível de se descrever. A cada passo, a cada milímetro gelado onde a palma dos pés se deitava e se deleitava, o contorno do beiral ia se completando, o desenho apontando o limite onde o lápis era retirado do papel. Dali em diante, o diante era já conhecido. Pois de um giro de 180 graus, algo assim tão vacilante que se espera a vertigem que não se havia e, consequentemente, a queda. Mas a firmeza de meus pés cravados aquelas pedras frias permanecia constante... e vibrante... e gélida. Não havia vento, não havia sopro. Havia uma árvore cravada no meio do caminho, no retorno do contorno aonde não cheguei a passar; mas que agora desponta como elemento verde na minha paisagem particular. Das mãos num dos galhos, o que desponta para fora, onde os pés não podem tocar o chão, agarrei-me com segurança e coloquei-me a balançar. Ora, como são estranhas estas brincadeiras de menina...

domingo, 10 de maio de 2009

 - Sobre pensares. Porque tem uns pensamentos que lotam, invadem a gente mesmo e nem sabemos explicar o que são. Você compreende?
- Claro que entendo, você está falando das flores que lhe dei.
[Ela pensou: no que ele estaria falando?] e acrescentou:
- Claro, ...as flores. Sim. Você consegue pensar por elas? Por um poema sujo?
Levantou-se devagar da poltrona verde-musgo onde costumava espreguiçar-se, largar-se... tão pesado. Olhou-a nos olhos bem próximo:
- Você quer que eu te peça pra ficar? Digo, pra ficar hoje aqui comigo?
- Não. [Jamais pediria].
- Tudo bem. [Não pediria se ela não dissesse]. - Mas você dizia de rosas, ou de poemas sujos... ou de mim?
- Dizia de você.
- Continue, me diga.
- Tudo bem, já está tarde. Vou embora.
- Fique bem.
E depois de um beijo nem tão leve nem tão intenso, o barulho da porta se fechando lentamente foi a última fagulha que um teve do outro naquele dia. Mas haviam os pensamentos... de desencontros. Você compreende?

Pretendo... a princípio... no princípio deste principiar principiando... em primeiro: parar com estes exageros linguísticos que rebuscam... [ao menos em excesso!].
Complicado fica tudo o que vira um vício, e viciei! Além da conta, acredito. Pois bem, com isto digo, o que quero dizer..... o que quis desde o início:
pretendo inscrever as leituras que já fiz... já li milhares de livros, etc, etc... na vida. Mas isto dispende tempo, energia... e esta prI-guicinha [licença poética!] que agora me acompanha tem de me deixar.
MAS... porém-contudo-entretando - clichê até esta frase, a correta, porque eu sempre escrevo entretanDo ao invés de entretanTo. Ato falho, deixei.
Retomando o fio... e desfiando... firmo aqui publicamente, pra que não fique só na memória e dela, de lá, se finde por esvair-se... sublimar... Compromisso. Um dia... farei!


como cacos nas paredes... palavras pequeninas escritas sobre o verde claro...
sobre a tinta seca e gasta...
Farelos de frases de um discurso qualquer, fagulhas de voz.

quinta-feira, 26 de março de 2009

Gosto dessa palavra por tudo aquilo que ela evoca. Não apenas na música, mas também em todas as relações que podem nascer e se criar entre as múltiplas partes de um todo, entre pessoas diferentes, entre volumes e proporções, entre objetos e meio ambiente, entre os vários ingredientes de um prato, entre alimentos que dão a impressão de terem sido feitos uns para os outros. Gosto da harmonia por aquilo que ela sugere de consonâncias e de afinidades, de correspondências e de equilíbrios. Acredito profundamente nas harmonias e nas ligações que se tecem, das mais evidentes às mais imperceptíveis, e até às mais inesperadas. Sou curioso, atento, ávido por conhecimentos, dos mais arcaicos aos mais vanguardistas, para ver emergir esse princípio de harmonia que coloco acima de qualquer outro.

(Alain Ducasse, chefe de cozinha francês)

domingo, 15 de março de 2009

KléberAlbuquerque

Ferve o pano de chão, prepara a manjedoura
Que vem chegando mais um pra dividir o cafofo
Mais uma boca no mundo
Mais um pra ficar gritando
Mais um perdido na vida
Mais um porteiro de prédio, se estudar!

Ferve o pano de chão que longe vêm os reis magos
Eles trazem farinha, fumo, metralhadora
Chama o pai do garoto pra conhecer o bastardo
Que vem mais um quase-nada
Mais um pra chorar de fome
Mais um pra levar tiro

Mais um servente na obra
Mais um bandido no morro
Mais um perdido na vida
Mais um pouco
Mais um torto

Pra se segurar na mão distraída de Deus

domingo, 1 de março de 2009

Para Luiz Arthur Nunes

A: Você é meu companheiro.
B: Hein?

A: Você é meu companheiro, eu disse.

B: O quê?

A: Eu disse que você é meu companheiro.

B: O que é que você quer dizer com isso?

A: Eu quero dizer que você é meu companheiro. Só isso.

B: Tem alguma coisa atrás, eu sinto.

A: Não. Não tem nada. Deixa de ser paranóico.

B: Não é disso que estou falando.

A: Você está falando do quê, então?

B: Eu estou falando disso que você falou agora.

A: Ah, sei. Que eu sou teu companheiro.

B: Não, não foi assim: que eu sou teu companheiro.

A: Você também sente?

B: O quê?

A: Que você é meu companheiro?

B: Não me confunda. Tem alguma coisa atrás, eu sei.

A: Atrás do companheiro?

B: É.

A: Não.

B: Você não sente?

A: Que você é meu companheiro? Sinto, sim. Claro que eu sinto. E você, não?

B: Não. Não é isso. Não é assim.

A: Você não quer que seja isso assim?

B: Não é que eu não queira: é que não é.

A: Não me confunda, por favor, não me confunda. No começo era claro.

B: Agora não?

A: Agora sim. Você quer?

B: O quê?

A: Ser meu companheiro.

B: Ser teu companheiro?

A: É.

B: Companheiro?

A: Sim.

B: Eu não sei. Por favor, não me confunda. No começo era claro. Tem alguma coisa atrás, você não vê?

A: Eu vejo. Eu quero.

B: O quê?

A: Que você seja meu companheiro.

B: Hein?

A: Eu quero que você seja meu companheiro, eu disse.

B: O quê?

A: Eu disse que eu quero que você seja meu companheiro.

B: Você disse?

A: Eu disse?

B: Não. Não foi assim: eu disse.

A: O quê?

B: Você é meu companheiro.

A: Hein?

(ad infinitum)





[................ infinito particular]

quinta-feira, 29 de janeiro de 2009

Feito febre, baixava às vezes nele aquela sensação de que nada daria jamais certo, que todos os esforços seriam para sempre inúteis, e coisa nenhuma de alguma forma se modificaria. Mais que sensação, densa certeza viscosa impedindo qualquer movimento em direção à luz. E além da certeza, a premonição de um futuro onde não haveria o menor esboço de uma espécie qualquer não sabia se de esperança, fé, alegria, mas certamente qualquer coisa assim.Eram dias parados, aqueles. Por mais que se movimentasse em gestos cotidianos - acordar, comer, caminhar, dormir, dentro dele algo permanecia imóvel. Como se seu corpo fosse apenas a moldura do desenho de um rosto apoiado sobre uma das mãos, olhos fixos na distância. Ausentou-se, diriam ao vê-lo, se o vissem. E não seria verdade. Nesses dias, estava presente como nunca, tão pleno e perto que estava dentro do que chamaria - tivesse palavras, mas não as tinha ou não queria tê-las - vaga e precisamente de: A Grande Falta.Era translúcida e gelada. Tivesse olhos, seriam certamente verdes, com remotas pupilas. À beira da praia certa vez encontrara um caco de garrafa tão burilado pelas ondas, areias e ventos que cintilava ao sol, pequena jóia vadia. Apertou-o entre os dedos, sentindo um frio anestésico que o impedia de perceber as gotas de sangue brotando mornas da palma da mão. Era assim A Grande Falta. Pudessem vê-lo, pudesse ver-se, veriam também o sangue, ele e os outros. Acontece que tornava-se invisível nesses dias. Olhando-se ao espelho, sabia de imediato que estava dentro Dela. No vidro, além dele mesmo, localizava apenas um claro reflexo esverdeado.Ela estava tão dentro dele quanto ele dentro Dela. Intrincados, a ponto de um tornar-se ao mesmo tempo fundo e superfície do outro. Amenizava-se às vezes no decorrer do dia, nuvens que se dissipam, turvo de água clareando até o cair da noite surpreendê-lo nítido, passado a limpo, passado a ferro. Então sorria, dava telefonemas, cantava ou ia ao cinema. Mas em outras vezes adensava-se feito céu cada vez mais escuro, turvo agitado subindo do fundo, vidro bafejado. Sem dormir, fosforescia entre os lençóis ouvindo os ruídos da madrugada chegarem como abafados por uma grossa camada de algodão. Dissipava-se ou concentrava-se na manhã seguinte e, concentrando-se, não era uma manhã seguinte, mas apenas uma fluida e mansa continuação sem solavancos.Seu maior medo era o destemor que sentia. Íntegro, sem mágoas nem carências ou expectativas. Inteiro, sem memórias nem fantasias. Mesmo o não-medo sequer sentia, pois não-dar-certo era o natural das coisas serem, imodificáveis, irredutíveis a qualquer tipo de esforço. Fosse íntimo das águas ou dos ares, teria quem sabe parâmetros para compreender esse quieto deslizar de peixe, ave. Criatura da terra, seu temor era quem sabe perder o apoio dos pés. E criatura do fogo, A Grande Falta crepitava em chamas dentro dele.Sua invisibilidade no entanto não o invisibilizava: encadernava-o meticulosa em um determinado corpo e uma voz particular e uns gestos habituais e alguns trejeitos pessoais que, aparentemente, eram ele mesmo. Por isso não é verdade que não o veriam. Veriam e viam, sim, aquela casca reproduzindo com perfeição o externo dele. Tão perfeito que nem ao menos provocava suspeitas aumentando as pausas entre as palavras, demorando o olhar, ralentando o passo daquele falso corpo.Atrás da casca, porém, o cristal incandescia. Debaixo da terra, fogo-fátuo soterrado tão profundamente que a pele nem reluzia.Alguma coisa que jamais teria, e tão consciente estava dessa para sempre ausência que, por paradoxal que pareça, era completo nesse estado de carência plena. Isso acontecia apenas quando dentro Dela, pois ao desembarcar, em vez de sorrir ou fazer coisas, freqüentemente limitava-se a chorar penoso como se apenas a dor fosse capaz de devolvê-lo ao estágio anterior. A dor desconsolada e inconsolável, em soluços que o sacudiam cada vez mais fortemente, a cada um deles partindo-se a casca, quebrando-se a moldura, rachando-se o vidro, apagando-se o fogo.Como uma outra espécie de felicidade, esse desembaraçar-se de uma também felicidade. Emerso, chafurdava em emoções: tinha desejos violentos, pequenas gulas, urgências perigosas, enternecimentos melados, ódios virulentos, tesões insaciáveis. Ouvia canções lamurientas, bebia para despertar fantasmas distraídos, relia ou escrevia cartas apaixonadas, transbordantes de rosas e abismos. Exausto, então, afogava-se num sono por vezes sem sonhos, por vezes - quando o ensaio geral das emoções artificialmente provocadas (mas que um dia, em outro plano, aquele da terra onde, supunha, gostava de pisar, aconteceriam realmente) não era suficiente - povoado com répteis frios, a tentar enlaçá-lo com tentáculos pegajosos e verdes olhos de pupilas verticais.Não saberia dizer com certeza como nem quando aconteceu. Mas um dia - um certo dia, um dia qualquer, um dia banal - deu-se conta que. Não, realmente não saberia dizer ao menos do que dera-se conta. Mas foi assim: olhando-se ao espelho, pela manhã, percebeu o claro reflexo esverdeado. Está de volta, pensou. E no mesmo instante, tão imediatamente seguinte que confundiu-se com o anterior, cantava, novamente ele mesmo. No segundo verso, pequena contração, tinha novamente entre os dedos o caco de vidro luminoso. Mas antes que a mão sangrasse, havia preparado um drinque, embora fosse de manhã, e bebia lento, todo intenso. Antes de engolir o líquido, seu corpo ganhou vértices súbitos, emoldurando o desenho de um rosto apoiado sobre uma das mãos abertas, olhos fixos na distância.Foi um dia movimentado, aquele. Sua casca partia-se e refazia-se, entardecer sombrio e meio-dia cegante intercalados. Fumou demais, sem terminar nenhum cigarro. Bebeu muitos cafés, deixando restos no fundo das xícaras. Exaltou-se, ausentou-se. No intervalo da ausência, distraía-se em chamá-la também, entre susto e fascínio, de A Grande Indiferença, ou A Grande Ausência, ou A Grande Partida, ou A Grande, ou A, ou. Na tentativa ou esperança, quem saberia, de conseguindo nomeá-la conseguir também controlá-la.Não conseguiu. Desimportou-se com aquilo. Tomado a intervalos pelo anônimo, atravessou a tarde, varou a noite, entrou madrugada adentro para encontrar a manhã seguinte, e outra tarde, e outra noite ainda, e nova madrugada, e assim por diante. Durante anos. Até as têmporas ficarem grisalhas, até afundarem os sulcos em torno dos lábios. Houvesse uma pausa, teria pedido ajuda, embora não soubesse ao certo a quem nem como. Não houve. Mas porque as coisas são mesmo assim, talvez por certa magia, predestinações, sinais ou simplesmente acaso, quem saberá, ou ainda por ser natural que assim fosse, e menos que natural, inevitável, fatalidade, trágicos encantos - enfim, houve um dia, marco, em que o tocaram de leve no ombro.Ele olhou para o lado. Ao lado havia Outra Pessoa. A Outra Pessoa olhava-o com cuidadosos olhos castanhos. Os cuidadosos olhos castanhos eram mornos, levemente preocupados, um pouco expectantes. As transformações tinham se tornado tão aceleradas que, no primeiro momento, não soube dizer se a Outra Pessoa via a ele ou a Ela, se se dirigia à moldura, à casca, ao cristal ou ao desenho, ao corpo original, às gotas de sangue. Isso num primeiro momento. Num segundo, teve certeza absoluta que se tinha desinvisibilizado. A Outra Pessoa olhava para uma coisa que não era uma coisa, era ele mesmo. Ele mesmo olhava para uma coisa que não era uma coisa, era Outra Pessoa. O coração dele batia e batia, cheio de sangue. Pousada sobre seu ombro, a mão da Outra Pessoa tinha veias cheias de sangue, latejando suaves.Alguma coisa explodiu, partida em cacos. A partir de então, tudo ficou ainda mais complicado. E mais real.
[Hilda Hilst]

E por que haverias de querer minha alma
Na tua cama?
Disse palavras líquidas, deleitosas, ásperas
Obscenas, porque era assim que gostávamos.
Mas não menti gozo prazer lascíviaNem omiti que a alma está além, buscandoAquele Outro.
E te repito: por que haveriasDe querer minha alma na tua cama?
Jubila-te da memória de coitos e de acertos.
Ou tenta-me de novo. Obriga-me.(Do Desejo - 1992)
Colada à tua boca a minha desordem.
O meu vasto querer.
O incompossível se fazendo ordem.
Colada à tua boca, mas descomedidaÁrduaConstrutor de ilusões examino-te sôfrega
Como se fosses morrer colado à minha boca.
Como se fosse nascer
E tu fosses o dia magnânimoEu te sorvo extremada à luz do amanhecer.
( Do Desejo - 1992)
Que canto há de cantar o que perdura?
A sombra, o sonho, o labirinto, o caosA vertigem de ser, a asa, o grito.
Que mitos, meu amor, entre os lençóis:
O que tu pensas gozo é tão finito
E o que pensas amor é muito mais.
Como cobrir-te de pássaros e plumas
E ao mesmo tempo te dizer adeusPorque imperfeito és carne e perecível
E o que eu desejo é luz e imaterial.
Que canto há de cantar o indefinível?
O toque sem tocar, o olhar sem verA alma, amor, entrelaçada dos indescritíveis.
Como te amar, sem nunca merecer?
(Da Noite - 1992)
(Do Desejo - Campinas, SP: Pontes, 1992.)
 

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