quinta-feira, 26 de março de 2009

Gosto dessa palavra por tudo aquilo que ela evoca. Não apenas na música, mas também em todas as relações que podem nascer e se criar entre as múltiplas partes de um todo, entre pessoas diferentes, entre volumes e proporções, entre objetos e meio ambiente, entre os vários ingredientes de um prato, entre alimentos que dão a impressão de terem sido feitos uns para os outros. Gosto da harmonia por aquilo que ela sugere de consonâncias e de afinidades, de correspondências e de equilíbrios. Acredito profundamente nas harmonias e nas ligações que se tecem, das mais evidentes às mais imperceptíveis, e até às mais inesperadas. Sou curioso, atento, ávido por conhecimentos, dos mais arcaicos aos mais vanguardistas, para ver emergir esse princípio de harmonia que coloco acima de qualquer outro.

(Alain Ducasse, chefe de cozinha francês)

domingo, 15 de março de 2009

KléberAlbuquerque

Ferve o pano de chão, prepara a manjedoura
Que vem chegando mais um pra dividir o cafofo
Mais uma boca no mundo
Mais um pra ficar gritando
Mais um perdido na vida
Mais um porteiro de prédio, se estudar!

Ferve o pano de chão que longe vêm os reis magos
Eles trazem farinha, fumo, metralhadora
Chama o pai do garoto pra conhecer o bastardo
Que vem mais um quase-nada
Mais um pra chorar de fome
Mais um pra levar tiro

Mais um servente na obra
Mais um bandido no morro
Mais um perdido na vida
Mais um pouco
Mais um torto

Pra se segurar na mão distraída de Deus

domingo, 1 de março de 2009

Para Luiz Arthur Nunes

A: Você é meu companheiro.
B: Hein?

A: Você é meu companheiro, eu disse.

B: O quê?

A: Eu disse que você é meu companheiro.

B: O que é que você quer dizer com isso?

A: Eu quero dizer que você é meu companheiro. Só isso.

B: Tem alguma coisa atrás, eu sinto.

A: Não. Não tem nada. Deixa de ser paranóico.

B: Não é disso que estou falando.

A: Você está falando do quê, então?

B: Eu estou falando disso que você falou agora.

A: Ah, sei. Que eu sou teu companheiro.

B: Não, não foi assim: que eu sou teu companheiro.

A: Você também sente?

B: O quê?

A: Que você é meu companheiro?

B: Não me confunda. Tem alguma coisa atrás, eu sei.

A: Atrás do companheiro?

B: É.

A: Não.

B: Você não sente?

A: Que você é meu companheiro? Sinto, sim. Claro que eu sinto. E você, não?

B: Não. Não é isso. Não é assim.

A: Você não quer que seja isso assim?

B: Não é que eu não queira: é que não é.

A: Não me confunda, por favor, não me confunda. No começo era claro.

B: Agora não?

A: Agora sim. Você quer?

B: O quê?

A: Ser meu companheiro.

B: Ser teu companheiro?

A: É.

B: Companheiro?

A: Sim.

B: Eu não sei. Por favor, não me confunda. No começo era claro. Tem alguma coisa atrás, você não vê?

A: Eu vejo. Eu quero.

B: O quê?

A: Que você seja meu companheiro.

B: Hein?

A: Eu quero que você seja meu companheiro, eu disse.

B: O quê?

A: Eu disse que eu quero que você seja meu companheiro.

B: Você disse?

A: Eu disse?

B: Não. Não foi assim: eu disse.

A: O quê?

B: Você é meu companheiro.

A: Hein?

(ad infinitum)





[................ infinito particular]
 

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