segunda-feira, 8 de dezembro de 2008

Curta-metragem exibido no Anima Mundi em São Paulo, em julho/2008. Muito sugestivo diria...rs..
Em entrevista a revista bravo!, o filósofo francês situa o olhar filosófico dentro de um panorâma atual, realístico, político; frente as crises mundiais e a própria realidade brasileira, a qual a violência se mostra tão presente. Filosofia fecunda que foge ao caráter romântico do termo, filosofia na contemporaneidade de modo afirmativo, positivo, no tocante as questões da sociedade dos nossos dias. Vale a pena conferir, toca em temas já tão trabalhados sem ser clichê.
Da insustentável leveza, há que se pensar... ou talvez, nem tanto. Após ter lido o livro de Milan Kundera, uns 6 meses antes, assiti ao filme homônimo. Não conheço quem foi o autor original do célebre dizer a respeito de que um filme nunca é tão bom quanto o livro. Mas é certo, quem quer que tenha dito isto deve tê-lo feito ao assistir a insustentável leveza do ser. Ao contrário do livro, o filme perde elementos, relações - tanto com objetos quanto com pessoas - que para o leitor de Kundera deixam o filme muito aquém do texto. Considera-se as limitações em transpor um romance de tal complexidade para uma linguagem cinematográfica. É uma pena, o filme é longo, tem cerca de duas horas e quarenta minutos [algo por volta disso], e ao cinéfilo desavisado, torna-se empobrecido mesmo no desconhecimento. A narrativa de Kundera é entrelaçada em si, entre os elementos que a compõe, o que, a meu ver, torna ainda mais difícil sua transposição para o cinema, com alguns elementos chaves sendo imperceptíveis em sua importância devido as limitações de filmagens, etc. O livro permite extrapolar idéias sobre diversos temas, é rico em assuntos e aberto a possibilidades, permitindo que o leitor pense diversificadamente no decorrer da trama, pensares distintos, diversos... O filme, a meu ver, não expressa de forma clara as percepções do texto. Tive a impressão de que em alguns momentos do filme, só o compreendi por já haver lido Kundera, ou perderia algum elemento sem saber de seu fundamento na cena.
DEUS. Os homens não se importariam tanto de morrer... Se a vida não fosse tão boa. Tão imperativamente, autoritariamente, alucinadamente boa... Talvez possamos mexer com isso...
VIDA. /INDIGNADA PELA PRIMEIRA VEZ/ O senhor está sugerindo piorar a vida dos que já são infelizes???
DEUS. Não se meta, menina. Você ainda é muito jovem para entender. /PARA EROS/. A causa da profunda infelicidade deles, meu caro, e foi por isso que eu o chamei aqui, diz respeito a você!!!
RELÂMPAGOS
EROS. Eu???? Senhor!!!! Eu sou o Deus do Amor, da Paixão, do Prazer! Somente posso dar alegria! Como pensa tal coisa de mim?
VIDA. Eros, culpado? Pelo amor de Deus!
DEUS. /NUMA EXPRESSÃO DE DOR AGUDA/ Amor! Foi pronunciada a palavra maldita! Chegamos então ao ponto. O Amor! É ele que tortura!! Os homens dizem que não, inventam milhões de desculpas, filosofias, políticas, ciências... Mas no fundo sofrem quando não são amados. É o Amor. E esta culpa eu não tenho. Não fui eu quem inventou o amor! Nunca sequer pensei nisso! Não admito que esse crime me seja imputado! Não fui eu. Criei o sexo e até a paixão, isso eu assumo. Para dar satisfação aos homens e ajudá-los a cumprir a necessária tarefa de perpetuar a humanidade. Mas o amor não! O Amor é uma invenção deles. Uma invenção perigosa e subversiva! Uma mentira, ilusão, delírio inventado para compensar a angústia da Morte eminente! O Amor é um efeito colateral do sexo que pode ser a causa da destruição da humanidade!!! /TROVÕES E RELÂMPAGOS QUE FAZEM EROS VOAR LONGE/ Precisamos acabar com o amor! Matá-lo, caro Eros. Ou reprimi-lo até que, por asfixia, morra.
(...)
VIDA. /SECRETÁRIA VIDA. DO SEU CANTO CHORANDO/ Se me permite Senhor, uma observação com todo respeito. Suas palavras me revoltam e me entristecem. Se, por exemplo, aquele seu filho, aquele judeu da Palestina, mais famoso, estivesse aqui conosco... Vendo o senhor falar assim do amor, não teria morrido na cruz e sim de desgosto.
DEUS. Aquele meu filho era um idealista, simpático. Mas tão arrogante! Por onde andará ele? Provavelmente querendo voltar ao Mundo, mas eu não deixo, não. Já proibi expressamente. Ele /FAZ O SINAL DA CRUZ/ também é um leviano. Prometeu ao mundo mais do que podia dar com essa história de amar aos outros como a si mesmo, cometeu um estelionato espiritual. Prejudicou multidões através dos séculos, com suas ilusões em forma de parábola. Talvez não fosse realmente meu filho. Nunca se sabe.
Madrugada, esta madrugada mesmo. Contei a um amigo que fiz um blog, ao que ele me respondeu que achava isto de ter um blog um tanto quanto... banal. Ora, ora... banal, pensei. Há que se pensar no que não é banal nesta vida. Longe de mim generalizar pura e simplesmente. Mas creio que, a despeito de opiniões contrárias, um blog – em si -, não tem absolutamente nada que o torne banal. Em absoluto, o que seria da arte, o que seria artístico, se aceitarmos que o banal impera, irremediavelmente? Portanto há, no mínimo, ínfimo que seja, algum espaço pro remédio... para o estranhamento. Cabe-se enquanto ferramenta, instrumento, artifício. E no meu caso, foi exatamente isso. A idéia de criar um blog foi um artifício mesmo para me policiar a escrever, coisa de que gosto muito, mas acabo deixando que outras ‘prioridades’ [não por opção minha] tomem a frente de prazeres mais caros. Exercitar a escrita pede algo de íntimo e também de deixar-se invadir, deixar-se levar pela escrita, pelos pensamentos que fluem enquanto o autor se torna mera mão que traduz em palavras. A arte, seja ela de que área for [fotografia, teatro, literatura, etc, etc, etc...], gera freqüentes discussões – o meio acadêmico que o diga – acerca do que se denominar artístico. O quê torna determinada obra artística e outra não? Penso que o sentimento de estranhamento que nos causa pode ser uma possibilidade. O aproximar-se, gostar, ao mesmo instante em que se estranha, intriga-se. Recentemente, cerca de um mês atrás, participei de uma oficina de cinema. Não mera interpretação de simbologias e caracteres, elementos inseridos no filme; mas um questionamento [logicamente sem grandes pretensões a uma resposta unívoca], sobre o que se considerar arte. De modo bastante resumido, decorre desta oficina os meus dizeres sobre o estranhamento, o encontro com algo que não nos é corriqueiro, [banal], é o que nos instiga expressão de estranhamento e o interrogar-se sobre a obra. Desta oficina e outras leituras, vivências e experimentações, permiti-me pensar sobre caracteres subjetivos e outros, um tanto mais objetivos, dos elementos que norteiam a classificar-se arte ou não. Curioso, difícil chegar a algum consenso. Entretanto, estaria a arte puramente submetida ao julgo individual?

domingo, 7 de dezembro de 2008

Juro! [e minto quando juro], mas desta vez é de verdade. Eu estava me de-sa-bi-to-lan-do dos excessos de psicologismos, dando um grito de fuga por assuntos mais prazerosos. Fuçando, é fuçando mesmo, na internet por alguns sites aí de umas tais revistas 'cults', não a cult mesmo, mas a bravo! [pode rir!], e encontrei alguns blogs de escritores muito interessantes. Estava ainda numas inquietações quanto a escrita, escrever o quê, escrever pra quem, ou sobre quem se escreve. O texto que encontrei, um conto, de um escritor português chamado José Luis Peixoto caiu como uma luva [expressão mais antiga, né?!...rs..] sobre estes pensamentos. Lembrou-me, alguns fragmentos e tais que li, o gaúcho Caio F. Abreu, embora menos característico, devido a erótica que Caio insere na própria escrita, não no tema, não só no tema, mas a escrita de Caio me parece erótica. Me lembrei de Caio devido a escrita de ambos ser fluída e 'escorrer'. Dentre os textos que li, gostei muito de um em especial e posto abaixo. Gostei tanto e quis dividir que comecei a dizê-lo a amigos que estavam online e a outros ainda enviei por e-mails.
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Texto sobre mim [José Luis Peixoto]

- Eu entendo bem que tenhas de escrever sobre alguma coisa mas, por favor, não escrevas sobre mim.
- Porquê?
- Porque prefiro dissolver-me na história do mundo. Um grito que chega ao silêncio, percebes? Um grito que chega ao esquecimento. Quem me conhece, conhece-me. Os outros não existem. Assim, se escreves sobre mim, os outros começam a acreditar que me conhecem também, o que é mentira. No fundo, não quero que escrevas sobre mim porque não quero que pactues com uma mentira.
- Só por isso?
- Não, claro que não. Ser o objecto da tua escrita não é como ser modelo de um quadro, não é como deixar que captes a minha imagem, não é passar algumas horas imóvel e já está. Ser o objecto da tua escrita é ter a minha biologia alterada, é sentir um ligeiro enjoo, um mau gosto na boca, como se tivesse acabado de acordar e tivesse bebido vodka na noite anterior. Sempre assim, durante dias, durante meses, anos, durante a vida toda, como se tivesse acabado de acordar e tivesse bebido vodka na noite anterior.
- Compreendo, mas não concordo.
- Não precisas concordar, basta que compreendas. E respeites.
- Sempre te respeitei.
- Não disse o contrário.
- Ah.
- Olha, escreve aquela citação do Wittgenstein.
- Não me digas o que devo escrever.
- Se escreveres sobre mim, estou, de certa forma, a dizer-te o que deves escrever. Ao ser como sou, determino as palavras que vais utilizar. Só poderás usar as palavras que me dizem. Ficarás privado de usar um grande número de palavras que não fazem parte de mim, nem de nada que sejam os meus movimentos, nem de nada que eu toque com a minha acção ou sequer com um pequeno resto da minha identidade. Essas palavras, signos, só poderão ser usadas se não tiveres qualquer compromisso com a verdade ou se fores incompetente.
- Para ti, tudo é sempre muito simples.
- E é simples, é mesmo simples. Se não tiveres qualquer compromisso com a verdade, não estarás a escrever sobre mim. Mesmo que acredites que estás a escrever sobre mim poderás estar a escrever sobre, por exemplo, um candeeiro.
- Mas o que é a verdade?
- A verdade é o meu cu. Porque é que fazes perguntas idiotas?
- Desculpa. Continua.
- Continuando, se fores incompetente, não conseguirás escrever sobre mim. Serás como uma criança a quem pedem para desenhar a mãe. A própria criança se apercebe de que aqueles riscos não são a sua mãe: os lábios dela não são um risco, o nariz dela não é um risco, os olhos dela não são dois pontinhos cegos. Então, a criança culpa-se a si própria e julga-se incompetente, não percebendo que a sua mãe, aquilo que para ela é a sua mãe, é impossível de desenhar.
- Então mesmo que eu queira, não posso escrever sobre ti, não consigo, é isso?
- Não. Não foi isso que eu disse. Se fosse assim, não te pedia para não o fazeres. Deixava-te andar, chamava-te passarinho e deixava-te andar.
- Passarinho?
- Ou pardal. Olha, porque é que não usas aquela citação do Wittgenstein?
- Qual citação?
- Aquela que tens na porta do frigorífico.
- Ah.
- Se começares com uma citação, ainda por cima do Wittgenstein, verás que é como se já estivesses meio trabalho feito. Os leitores vão considerar que tens um alto nível intelectual e vão querer associar-se a ti, vão querer dizer que já te leram porque vão estar convencidos de que, desse modo, também eles demonstram um alto nível intelectual. Na realidade, nem é necessário que cites o Wittgenstein, basta que refiras o seu nome. Assim: Wittgenstein. É claro que, mais tarde, começarão também a apenas referir o teu nome. Muito poucos te lerão realmente, mas esses poucos serão aqueles que importam: professores universitários, críticos, júris de prémios literários. Mas o teu nome será referido. É isso que importa, não é?
- Sim, é isso que importa.
- Como vês, não há motivo para escreveres sobre mim.
- Enganas-te. Há motivos fortes para escrever sobre ti.
- Há?
- Há.
- Há?
- Há.
- Quais?
- O primeiro motivo é o amor.
- Piegas. Não tens nada melhor do que esse sentimentalismo bàsico?
- O segundo motivo é que estou grávido de ti.
- Como aconteceu isso? Não tivemos nenhum contacto a esse nível e, além do mais, que eu saiba, os homens não engravidam.
- Se a lógica explicasse tudo, a felicidade poderia ser calculada. A lógica é sempre o mais fácil, é sempre o caminho mais simples. Infelizmente, o mundo não se compadece com essas invenções.
- Mas o que há para além da lógica?
- Há o teu medo, toda a extensão do teu medo. E há muito mais. Esse também é um dos motivos pelos quais quero escrever sobre ti.
- Explica.
- Como tentaste dizer quando falaste sobre o compromisso com a verdade e a incompetência, escrever sobre ti será sempre escrever sobre mim. Definir-te implica, muito antes, definir-me.
- Egocêntrico.
- Desculpa, não ouvi. Podes repetir?
- Egocêntrico.
- Chama-me o que quiseres, piegas, egocêntrico, tanto me faz. O mundo não se detém perante os teus medos e as tuas inseguranças. Vou escrever sobre ti porque és o único assunto.
- E, no fundo, vais sempre escrever sobre ti, não é?
- Sim, no fundo, vou sempre escrever sobre mim.
 

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